quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Ismália *



Em noite tão estrelada
Me sinto a lua, vazia
Caminhei até tua porta, amada
Nesta casa que um dia foi minha

Te vi, da janela, jogar-se
Na calçada te encontrei sozinha
Ausente de razão, de cuidado
Joguei-me no chão, ao teu lado
Assim, de algum modo te tinha

Beijei tua mão tristemente
Com uma lágrima salguei teu rosto pálido
Me vi só e somente
Me prendi ao teu peito 'inda cálido

Mas nenhum sinal de vida
Nenhum batimento idiota
Abraçara, de certo, a partida
Aceitara, de fato, a derrota

Para sempre longe de mim
Eternamente longe da razão
Como, Ismália, deixaste-me assim?
Para sempre sem solução?



*Ler o poema "Ismália" de Alphonsus de Guimaraens

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Vaidade

Poesia, na verdade, é só saudade 
De um momento que se pretende eternizar
Minha arte, de fato, é vaidade
De mostrar que me aprovo por te amar
Meu sacrifício, toda noite, é sempre belo
São algumas rimas que escrevo pra te dar
Mas toda manhã, quando me leio
Que surpresa! 
Da ingenuidade que, às vezes, deixo me tomar 
De achar que com papel e tinta velha 

Eu mude sua forma de amar


Sobre perdão, culpa e silêncio

Viajou quilômetros para encontrá-lo. Não trazia nada nas mãos, além de uma à outra e a grande vontade de fechá-las num abraço. E os pés, já fracos pela fome do terceiro dia sem ingerir um só pão, se encontravam firmes somente pelo dever – consigo mesmo- de se desculpar. Bateu descompassadamente no portão com toda sua força. Do outro lado, como se entendendo o clamor das batidas, foi em direção à maçaneta sem fazer nenhuma pergunta. Puxou-a experimentando um misto de alegria e desconforto, e viu, diante de si, os olhos de quem já não dormia bem. Procurou uma palavra, mas todas lhe pararam na garganta. Decidiu, somente, abrir passagem e com um olhar tênue convidá-lo a entrar. Com passos lentos e trêmulos, conseguiu passar a porta, e no terreno até os cães pareciam respeitar sua dor e, pela primeira vez, não o lamberam. Com a força que ainda lhe restara olhou demoradamente aquele rosto que, dias atrás estava em chamas, e aquela boca que proferira palavras que lhe roubara o apetite. Manteve o olhar e uma lágrima, apenas, escorreu-lhe pelo olho direito. Entendendo a súplica silenciosa, o outro o envolveu em um abraço, o que, ao primeiro, pareceu bem mais confortável depois de dias em abstinência.  Por um momento, procurou forças para dar as mãos, mas seus membros estavam imobilizados. O abraço não acolhia com força, eram os seus braços que não o obedeciam. Inspirou, então, o máximo que seus pulmões poderiam suportar a fim de sentir aquele momento por completo. Se o perdão tivesse cheiro, cheiraria amadeirado e se tivesse um preço, custaria toda uma vida.

domingo, 8 de setembro de 2013

Livre

Prefiro meu descaminho
O puro erro de tudo que eu faço
Que seu pensamento mesquinho
E a fria retidão do teu passo

Que a vida seja bela, ainda que breve
E que encontremos todo o amor devido
Como a criança que anda tão leve
Não tem pelo mundo o coração dividido

A vitória do erro, do poema não publicado
Do riso proibido, do beijo roubado
A vitória da vida, da intuição

Desfazendo os laços 
Da tua carne amarrada
Que libera teus sonhos
E te tira do chão

Prefiro meu caminho, um tanto inseguro
Que a tua certeza
Teu sonho impuro

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Explicação e penitência

Te amava nas horas de tédio 
Na dificuldade de me ver sozinho
Te amava por carência
Minha sede de carinho
É que ando muito triste
Muito pouco entusiasmado 
E te amar é um remédio
A penitência ao meu pecado
De te querer por perto 
Sem estarmos lado a lado

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Súplica

Me deixa fumar do teu cigarro
E segurar a tua mão 
Me alimentar do teu escarro 
Só pela tua diversão

Me deixa estar ao teu lado 
Esse pobre dependente 
Que tanto quer o teu cuidado 
E tanto está carente

Para então fazer sentido
Como se fosse de verdade
O amor me prometido
Que foi somente vaidade

Mas, mesmo assim, me chama
Pra tua realidade torta
Finge um pouco que me ama
Vem 
E abre a tua porta

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Se desarma
E me deixa amar você
Faz da minha pele, tua alma
E do meu corpo, o teu querer. 

Me acalma
Com a forte inquietação do parecer
Tira, desse corpo, tua bermuda
Tira, da cabeça, o me esquecer

E volta pra casa
Como quem sempre quis retornar
Traz nos teu bolso o cigarro
Que saiu para comprar

segunda-feira, 24 de junho de 2013

sábado, 15 de junho de 2013

Nunca fui tão petulante
Mas alegria de amigo
Na verdade, é ser amante

domingo, 26 de maio de 2013

Me livrei do amor
Com um litro de cachaça
Mas o tédio, essa desgraça 
Não sai do meu cobertor 

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Boderline

Essas gotas que aceito como chuva
Nunca saciarão a minha sede, a minha vontade
Só me importa o amor, que infinito
Não seja sonho, seja então realidade 

Os meus erros, eu conserto com meu sangue
E assim, eu me puno por te amar
Até não sobrar uma só gota em meu corpo
Até que enfim não queira te desejar

Caminharei descalço nessas brasas 
Já permiti a esse fogo me queimar
Me entregarei, de fato, ao meu fracasso
E deixarei a minha pele definhar 

Até que então esse amor, que infinito 
Perceba quão terrível o meu tormento
Me banhe em um lago bem bonito 
Me restaure dessas cinzas em silêncio 

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Embriagado

Foto: Ricardo Spíndola 

Eu que nem bebia
Tomei outra cerveja
Para te esquecer
E cada gole que dava
Era uma forma
de amar e morrer
Amor disforme e gratuito
Que nem se dá conta de tanto querer
E vive nesse vale de álcool
Nessa adega de lágrimas para sobreviver
E viver temporariamente distante
De um tão constante e iminente sofrer


quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Respiração




Quando quiseres, inspiração
Tomar meu corpo novamente
Aqui estarei, de novo, pronto
Te aceitarei eternamente
Quando quiseres, poesia
Nem precisa de licença
Me entrego com um sorriso
Te atendo com um lamento
Quando puderes, bela moça
Em ti, estarei atento
Com alegria te chamo
Com uma lágrima me arrependo 

Querer-te bem

Waiting for Godot, de Beckett. "ESTRAGON: And if he comes?" 


Já faz anos que não te vejo
É tão triste constatar
Que ainda o meu desejo
A cada ano é te encontrar
Apago sempre outra vela
Na esperança de que enfim
Meu desejo se realize
E você volte pra mim

Mas por já teres decidido
Em te manter tão afastado
Faço um segundo pedido
Para que sejas sempre amado
Na casa que escolhestes viver
Com quem puseste ao teu lado
Viva bem, meu amor,
e te perdoo por ter me abandonado. 

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Primeira oração




Que eu tire o excesso de um ano cansado
E comece tão livre, sem tanto cuidado
Que eu seja mais leve, feliz e amado
Que eu recomece menos embriagado
E que enfim eu consiga,
em meio a tanta novidade
Enxergar minha poesia
De um ano que foi,
e deixou calmaria
De cada momento, uma breve saudade
E que a experiência se faça válida
E seja minha sabedoria
Senão pro ano inteiro
Que eu seja melhor por um dia